por Léo Voigt*
Artigo Zero Hora
20 de maio de 2010
A história da menoridade no Brasil é tema que há muito debatemos, trabalhamos, dissentimos e avançamos. Este tema ganha maior paixão, de todos os lados, quando se trata de adolescentes e jovens adultos em conflito com a lei.
Para avançar nas políticas de atendimento e proteção, foram necessárias várias iniciativas nos últimos 20 anos e muitos investimentos. Foi necessária a Conferência de Nova York em 1989, que pactuou direitos para a infância e juventude. Com base nesta conferência da Organização das Nações Unidas (ONU), aprovamos o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e, posterior a isto, nos dedicamos no Brasil a constituir os serviços de acolhimento, proteção e garantias (rede de proteção) que o novo paradigma exigia para funcionar.
Esta verdadeira revolução no tratamento da infância e juventude foi obstinada e continuadamente implantada, apesar de percalços, resistências e incompreensões. Levamos 20 anos para transitar da antiga doutrina da situação irregular da infância pobre para o inovador olhar de sujeitos em particular fase de desenvolvimento, possuidores de direitos e alvos de prioridade.
Entretanto, no Rio Grande do Sul, vexatoriamente, esta obra ainda está incompleta. Guardamos os meninos em conflito com a lei, em nome do cumprimento de medida socioeducativa com internação (privação da liberdade), com os mesmos equipamentos e estruturas da etapa anterior. No passado, esses jovens eram vistos como uma ameaça e colocados em grandes estruturas, aos milhares, em orfanatos e reformatórios, protegendo apenas a sociedade, porém condenando para toda a vida os meninos.
Enquanto não encerramos definitivamente o modelo de instituição total - Febem, cadeião, depósito de jovens -, não será possível olhá-los de frente, como brasileiros com direitos que não tiveram acesso aos mesmos bens e ao desenvolvimento que as minhas filhas, os seus filhos, as crianças brasileiras em média.
A prevalência de alguns interesses localizados e privados, a defesa de comodidades da corporação, uma falácia ambientalista e o confrontacionismo da política gaúcha não podem prevalecer sobre a urgente descentralização da Fundação de Atendimento Socioeducativo (Fase) e a conclusão da tarefa civilizatória, iniciada em 1990. Mais que um projeto de lei feito por um governo - qualquer governo -, trata-se de uma tarefa pública da sociedade gaúcha que persiste do século passado; uma aspiração do sistema de proteção que se constituiu desde o ECA, cujos integrantes, unidos, esperam este encerramento arquitetônico/patrimonialista e por isto muito trabalham.
Os jovens pobres, na sua maioria negros e mulatos, que há séculos sofrem com a exclusão transgeracional e a perversa institucionalização compulsória, não merecem mais este castigo.
*Cientista político
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