Rodrigo Ribeiro, pedagogo especialista em docência do ensino superior, envia relato sobre uma situação surreal que está vivendo, envolvendo o SUS de Porto Alegre. No título do relato, ele resume a natureza do problema:
Por defender uma idosa na fila do SUS, sinto-me o Papai Noel, julgado criminalmente em “Milagre na rua 34”
“É pertinente iniciar este relato lembrando do diálogo entre o gato Chechire e Alice, em “Alice no país das maravilhas”. Alice pergunta qual o caminho seguir, pois eram vários, mas o gato responde que não importa o caminho, desde que se caminhe bastante e saiba onde se quer chegar. Minha caminhada tem sido plena, aos 32 anos estou banhado pelos ideais de justiça. Trata-se de um princípio herdado pelo pai, policial civil aposentado, e pelos ensinamentos da vida. Casado com uma enfermeira Mestre em Ciências da Saúde Humana que, formada há 10 anos, sempre atuou no SUS, pude contribuir com os principais princípios da Saúde brasileira. Foi por influência dela que cheguei a ser co-ministrante na disciplina de Organização do Processo de Trabalho em Enfermagem, onde a Carta dos Direitos dos Usuários do SUS é ensinada e defendida como premissa básica.
Há inúmeras correntes que atacam o SUS, usando de fatos tais quais os que estou vivendo, mas na verdade, o problema não é o SUS, e sim uma pessoa que o está gerenciando na mínima instância. O SUS é perfeito. No meu caso, a ingerência está na Prefeitura de Porto Alegre, especificamente na Unidade Básica de Saúde Vila Ipiranga, na Zona Norte. Abuso de poder, perseguição, desrespeito aos idosos, calúnia, são algumas das prerrogativas da gerência daquela UBS. Todos têm uma história, pois a minha retrata a mais vil prática de injustiça, desumanidade e opressão que poderia haver, sobretudo em se tratando da prestação de um serviço público tão visado quanto o SUS.
Com um problema preocupante no esôfago, estava na fila da UBS de meu bairro, e testemunhei a figura do segurança aos gritos com uma senhora pós cirúrgica – com a identidade em mãos, dizendo que ela não poderia consultar, pois não portava a carteira do SUS. Ao intervir, fui convidado a entrar na sala da gerente acompanhado da senhora, mas quando a gerente percebeu que eu havia conhecido a idosa na fila, chamou o segurança para me expulsar da sala. Após muitas lágrimas da idosa, e minha insistência a favor dela do lado de fora, a gerente “sensibilizou-se” e disponibilizou de uma ficha, vários lugares atrás. Eu também fui penalizado com a perca de alguns lugares na fila.
A partir daquele instante, comecei a ser literalmente perseguido pelo segurança e pela gerente da UBS. Não entendo como uma UBS formada por uma equipe tão dinâmica e prestativa, tal qual esta da Vila Ipiranga, na Zona Norte de Porto Alegre, pode ter um segurança e uma gerente tão ditadores quanto se apresentaram para mim, um usuário que não se calou diante de uma injustiça contra uma idosa.
Sempre que eu ia verificar meus encaminhamentos de exames e para especialistas, meu nome não estava na listagem. Lógico, diante da condição que me encontrava, suspeitando da perseguição, solicitava o direito de ver meus prontuários, agenda completa dos encaminhamentos, saber a ordem que me encontrava. Tudo era negado, inclusive sendo até impedido meu acesso à UBS. Diante de meu protesto, verbalizando educadamente o senso de indignação, o segurança e a gerente chamavam a Guarda Municipal, que, percebendo a própria injustificada presença de policiais, convenciam a gerente a conversar comigo, porém ela sempre mostrava dados incompletos. Em um dos encontros com a Guarda Municipal na UBS da Vila Ipiranga, um deles amigavelmente orientou-me a denunciar a situação no serviço “Fala Porto Alegre – 156”, o que fiz prontamente.
Até hoje não recebi um parecer da Prefeitura de Porto Alegre a respeito dos fatos, mas foi para se vingar, que a gerente do posto, provavelmente em comum acordo com o segurança, denunciou-me criminalmente na 14ª DP, dizendo que eu gritava, fazia baderna, perturbava a paz e o sossego alheio e que me fiz passar por acompanhante de uma idosa.
Enfim, vou a julgamento.
Urge um manifesto popular contra esta prática, a da opressão em qualquer serviço público ou privado. Não pode, um cidadão de bem, trabalhador, que prega a paz, a justiça, a humanidade, ser perseguido desta forma. Paulo Freire, em “A pedagogia do oprimido”, fala da cadeia de opressão que assola o sistema. Certamente o SUS não é o topo desta cadeia, bem ao contrário, ele representa a democratização da saúde, mas tenho certeza que a gerente da UBS em Porto Alegre serve a alguém.
Em “Milagre na rua 34”, Papai Noel foi absolvido da acusação de ser louco por pregar a paz, a benevolência, o espírito de natal. Advogados me disseram que o Juizado Especial Criminal não é filme”.
Do blog RS Urgente - Marco Weissheimer
Nenhum comentário:
Postar um comentário